Após uma pequena prática de
letramento audiovisual, chegou a hora de lidar como nossos objetos de estudo:
os filmes. Mas, antes falemos um pouco
mais do significado de “letramento audiovisual”. Sabemos que os seres humanos
lidam com imagens desde muito cedo – veja nas postagens anteriores e em Ginzburg
(1989)[1] – o que chamo de
letramento não passa de um processo de objetivação de práticas antropológicas,
ou seja, continuar a fazer o que fazemos desde sempre, mas agora, desnaturalizando
o processo.
A atitude analítica não
cessará mais, pois, de agora em diante, todas as vezes que você se deparar com
imagens e/ou imagens-movimento elas se converterão em algo que demanda
análise e explicação, de forma a evitar que se tornem “naturais”. Teoricamente, você passa a concebê-las como “representação”
da realidade(s), e dessa forma, deixam de dar ilusão de serem o
ou um real, ganhando status de algo que foi
mediado pelo significado que a cultura lhe atribui.
Bakhtin explica esses diálogos
que a literatura trava com essa realidade – ou o que ele chama de
contexto “não verbais” – ele cita uma passagem de Dostoiévski na
qual o personagem diz algo como: “o inverno...”. Não é difícil pensar que esse inverno
tem significado distinto se for dito por um nordestino, pois isso é
sinal de chuva, verde, fartura, ao contrário do que seria para um russo.
Observe que o processo de letramento
não se encerra numa análise rápida. O que fica evidente é que há muito mais a
ser feito. Mas, o que virá daqui em diante demanda uma teoria, um conjunto de
ferramentas teóricas que permita o desmonte das estratégias que
orientaram as produções dessas realidades representadas e, para além disso,
quais as intenções que sua fabricação visava a alcançar.
Merece atenção o fato de que não
vamos tentar invadir as mentes dos seres humanos que realizaram o filme, mas,
ao contrário, basear nossa investigação naquilo que as próprias obras e no
que seus realizadores nos revelam sobre o mundo que representam. Afinal,
nem obras nem humanos estão descolados da cultura. Todos “habitam”, como os
personagens dos filmes, um universo material e simbólico que
confere significado ao mundo “audiovisual” que foi reunido para “fabricar”
o filme.
[1] Não devemos esquecer outros
campo de conhecimento que, de forma distinta, também argumentam a respeito da
prática antropológica de lidar com imagens, como psicologia da percepção,
semiótica da imagem, psicanálise, citando algumas.
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