No caso da História, importa que o uso desse aparato permita que as questões históricas nele “reveladas” sejam objeto de estudo. Aliás, esse foi o argumento defendido por Marc Ferro quando concebeu os filmes como fonte histórica.[1] Acrescente-se que um filme, pelas características que o cinema apresenta, pode abordar com tanta expertise algum tema que ele acaba, inclusive, antecipando questões históricas, sociológicas, antropológicas etc.
Representação de Chica / Créditos Wikimedia Commonshttps://www.geledes.org.br/wp-content/uploads/2009/06/chica-da-silva-1.jpg
Filmes, muitas vezes, escolhem temas pouco visitados ou desconcertantes para a sociedades; ou, melhor ainda, formulam abordagens que inovam nos métodos para se aproximar deles. Nalguns casos podem inovar até mesmo quanto à temática, à questão formulada ou ao modo de refletir sobre os problemas.
Os exemplos dessas possibilidades são muitos, como o filme Xica da Silva (1976) de Cacá Diegues.[2] Observe-se que os debates sobre negritude e gênero no contexto do Brasil contemporâneo não estavam consolidados, tampouco pesquisas sobre os temas tinham a dimensão que têm atualmente. Diegues afirmou, em entrevista, que seu interesse pela personagem foi provocado pelo desfile da Grêmio Recreativo Escola de Samba Salgueiro (1963).[3]
Isabel Valença incorpora Xica da Silva, no desfile do Salgueiro em 1965 sobre a História do Carnaval Carioca. Ver em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Isabel_Valen%C3%A7a#/media/Ficheiro:Acad%C3%AAmicos_do_Salgueiro,_1965_(3).jpg
O primeiro registro escrito sobre a história de Chica da Silva pode ser encontrado “no livro Memórias do Distrito Diamantino, de 1868. Foi seu autor, o advogado Joaquim Felício dos Santos”[4] que também inspirou a telenovela da Rede Manchete Xica da Silva[5] e o documentário A Rainha das Américas que também aborda a personagem histórica que foi uma mulher negra escravizada do interior do Brasil.
Cartaz do filme Xica da Silva de Cacá Diegues (1976); Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Xica_da_Silva_(filme)#/media/Ficheiro:Xica_da_Silva.jpg
Observe-se como a simples historicização de uma personagem e/ou obras cujo tema é o mesmo – no caso, uma personagem – permitem identificar os diálogos mais explícitos que são operados na cultura ao longo do tempo. Um breve estudo ainda pode indicar como esses “diálogos” são “facilmente apreendidos” e que até poderiam ser considerados um tema inscrito em processo de longa duração. O exemplo do filme Xica da Silva serve para ilustrar a dimensão e o espectro com o qual o cinema permite trabalhar, seja na sala de aula ou na biblioteca.
Mas,
também pode ocorrer que a forma de tratar algumas questões sejam tão
elucidativas ou até mais que outras formas de abordagem. Alguns exemplos nos
ajudam a pensar a respeito do assunto. Vamos a eles, aos filmes.
[1] FERRO, Marc. "O filme: uma
contra-análise da sociedade?" In: LE GOFF, Jacques & NORA,
Pierre (Org). História:
novos objetos. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1979, pp. 199-213.
[2] Sobre o tema, consultar: http://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2016/07/a-escrava-que-virou-rainha-documentario-e-livros-revivem-historia-da-brasileira-que-rompeu-padroes-do-seculo-18.html
[3] Sobre o tema consultar o sítio da
Escola de Samba do Salgueiro (http://www.salgueiro.com.br/anos-60/) e ainda
dois canais no Youtube com imagens-movimento de época: https://www.youtube.com/watch?v=TCDQv7oDx40
, https://www.youtube.com/watch?v=LDR6wGZepQc
[4] Citação anterior de O Globo. Veja também uma opinião mais qualificada -de uma pesquisadora - sobre essa grande personagem personagem em:
[5]
Xica da Silva é uma telenovela brasileira produzida e exibida pela Rede
Manchete entre 17 de setembro de 1996 a 11 de agosto de 1997, Escrita por
Walcyr Carrasco. Ver mais em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Xica_da_Silva_(telenovela)
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